Educação para agentes públicos

Escrito por Elinaldo Azevedo
em 27/01/2024

Nos anos de 1990, quando ganhei um monitor colorido, tive o prazer de jogar jogos com temáticas de fantasia e terror. Mas o gênero de jogo que mais me chamava atenção era o Management Game (Jogo de gerenciamento ou Gestão).

Sun Tzu quando escreveu sua famosa obra A arte da Guerra (500 a.C.), disse neste sentido: "Uma vez consciente das vantagens dos meus planos, o general terá de criar situações para sua concretização. Por 'situações', quero dizer que deverá atuar com rapidez e de acordo com o que lhe é vantajoso para poder controlar os resultados. Todo guerreiro se baseia em simulações."

As simulações trazem a forma mais próxima de treinamento mental e físico para concretizar uma ação planejada. Simular as situações que Sun Tzu diz, é essencial para testar uma estratégia.

Antes de ler o livro de Sun Tzu, eu já testava minhas estratégias antes de saber que este conceito já tinha sido escrito há mais 2.500 anos. Eu simplesmente entrava no jogo e jogava. Mas eu sabia que aquilo iria me afetar de forma positiva em algum momento. Utilizar as estratégias de gerenciamento era divertido, eu pensava.

Esta premissa da Arte da guerra será repercutida para as origens da indústria de jogos. Sim, a indústria da diversão teve sua origem nas guerras. Em seu artigo, intitulado Management Games (1962), Samuel Elion diz que este tipo de jogo remonta no século XIX através do jogos militares e das palavras de Franc M. Ricciardi: "Nos jogos de guerra realizados pelas Forças Armadas, os oficiais comandantes do Exército, Marinha e Força Aérea têm a oportunidade de praticar a tomada de decisões de forma criativa em uma infinidade de situações competitivas hipotéticas, mas realistas. Além disso, são obrigados a tomar decisões em áreas fora de sua especialidade; um oficial de comunicação naval, por exemplo, pode desempenhar o papel de comandante de uma força-tarefa. Por que, então, os empresários não deveriam ter a mesma oportunidade?". Poderei abordar este tipo de jogo em outro artigo.

A partir da abordagem de Samuel Elion, outros autores já colocam Management Games (chamarei de MG para facilitar) também como Business Games (Jogos de negócios, também chamarei de BG). Vic Gilgeous e Mirabelle D’Cruz classificam tanto MG quanto BG como um único tipo de jogo, mas também destacam as vantagens de utilizá-los como uma forma de treinamento. Já David Rumeser e Margaret Emsley inserem os MGs como Serious Games (SGs, Jogos Sérios), quem dizem que "Jogos sérios ou educativos integram as características dos jogos focados em entretenimento e das simulações focadas em educação. Os jogos sérios são projetados não apenas para envolver os aprendizes, mas também para facilitar a aprendizagem e/ou mudança de comportamento. Através da jogabilidade desses jogos, os participantes do treinamento ou os alunos podem aprender novas habilidades e conceitos e desenvolver seu conhecimento existente. Esses jogos são simplificações e condensações de problemas do mundo real, que permitem aos aprendizes experimentar com segurança decisões (futuras) e refletir sobre o resultado. Em várias iterações, os aprendizes tomam decisões, formam coalizões e/ou negociam com base em objetivos ou interesses dados e/ou auto-selecionados."

O primeiro jogo digital/analógico de MG que se tem notícia foi o The Sumerian Game. Um jogo criado pela professora Mabel Addis em 1964, feito para o IBM 7090, no qual ela utilizava este computador junto com um projetor para ensinar sobre a cidade sumeriana de Lagas. Não foi apenas o primeiro MG para computadores mas também foi o primeiro Jogo educacional (Edutainment) para escolas primárias dos EUA e tinha como mecânica principal o gerenciamento da cidade e seus habitantes.

Durante minha jornada dos MGs, encontrei o Sim City, criado por Will Wright em 1989 para o PC-DOS. Esse jogo me fascinou muito por ter uma mecânica baseada em fontes de produção e sua economia simples mas efetiva. O jogador torna-se um administrador permanente da cidade que a constrói, tentando evoluí-la e enfrentando os desastres naturais, como terremotos, enchentes, furacões etc, e artificiais, como monstros e invasão alienígena. O que mais me chamou a atenção neste tipo de mecânica, foi a tomada de decisão já citada por Samuel Elion e a relação delas na evolução da cidade. Já a versão mais atualizada, o Sim City 4, trouxe novos desafios mais reais e condizentes com políticas mundiais. Era possível criar empresas de energia limpa, estratégias de segurança urbana, coleta de lixo, evolução de prédios, pesquisas de melhoria tecnológicas etc. Mas também os desafios eram mais complexos pela tomada de decisão, por exemplo, se o jogador criasse muitas indústrias poluentes, teria que criar mais hospitais para atender a demanda dos doentes. Outro exemplo é o acréscimo de protestos da população por conta de más decisões, se o jogador cobrasse impostos muito altos e não investisse no que a maioria da população queria, várias ruas se encheriam de pessoas protestando, podendo até mesmo chegar ao caos total e haver quebra-quebra na cidade.

Até o fechamento deste texto, o jogo mais realista para este tipo de gênero é o Cities Skylines 2. Ainda não joguei, mas a primeira versão já era muito mais complexa que o Sim City 4. Existem muitas informações mostradas para o administrador-jogador, fluxo do trânsito, níveis de poluição, deterioração de prédios, satisfação da população, e todos os dados provenientes de secretarias da administração. Definitivamente é o melhor MG para a tomada de decisões para o aprendizado na administração pública. Quem quiser, um dia, ser o prefeito de uma cidade, recomendo usar este jogo como plataforma de estudos e treinamento.

O jogo que direi agora também está dentro do escopo de MGs, mas nele o jogador não inicia na melhor fase da administração. Ele tem um misto de Sobrevivência e MG, e coloca o jogador no papel de um líder de comunidade que tenta sobreviver no frio extremo e com poucos recursos disponíveis. Frostpunk é um MG com ambientação mais melancólica e sombria, até mesmo a música torna mais triste a jogabilidade. Diferentemente dos jogos já citados, o orçamento inicial é mais limitado e a partida já começa no desastre natural, neste caso um frio extremo (uma nova era do gelo hipotética). Os cidadãos tem apenas um único refúgio de conforto, uma grande fornalha central que não deve se apagar. Se o gerenciamento dos recursos e da população não for satisfatória para todos, o jogador é banido da comunidade e o jogo acaba. Os conflitos neste jogo são bem interessantes para as tomadas de decisões, como: O que será feito com os corpos das pessoas que morreram? O que será feito com as pessoas famintas já que os trabalhos estão cansados para produzir comida? O que fazer com os trabalhadores "inúteis" (que tem alguma amputação), quando as produções diminuírem? São dilemas éticos e morais que o jogo coloca ao administrador para tomar as decisões com base em seus próprios princípios.

As mecânicas destes jogos tem um tipo de desafio para tornas as situações "equilibradas", ou seja, as ações precisam acontecer para manter o equilíbrio do jogo, se algo acontece para desequilibrar a situação, então o jogador precisa tomar decisões para reequilibrar. E este é o maior desafio destes jogos. Às vezes percebemos que nossa vida quando está bem equilibrada, acontece algo que a desequilibra, então precisamos tomar decisões para voltar ao equilíbrio. Quando não conseguimos, nos sentimos frustrados e desnorteados, então podemos recorrer à ajuda de outras pessoas para equilibrar nossa vida. Contudo, agora você já sabe como treinar isso, seja um simples jogador querendo diversão ou um agente público querendo aprimorar seus conhecimentos.

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